sexta-feira, 24 de abril de 2009

Infância

Não tinha ninguém com amor aos livros. A primeira vez que fui a uma biblioteca tinha 12 anos. Fui sozinha mas trouxe para casa as dezenas de heróis que couberam em 5 livros.
Esfolava os joelhos na rua, caía de bicicleta,lia livros e arrumava a casa toda só para ouvir e ver o pai todo babado.
O incentivo pelos livros não existiu. O pai não percebia o porquê do fascínio mas gostava dele. Só tinha 3 enciclopédias em casa e ele também não percebia porque é que nunca as folheava. Odiava-as porque sempre que ia à biblioteca ouvia falar das malditas.
Certo dia arderam. Ardeu o andar da minha infância, arderam as enciclopédias que eu detestava, a maior parte das minhas fotografias de criança e ardeu a Nina, a cadela do coração do meu pai. Ardeu tudo. Antes que ardessem também os irmãos, tirei-os de lá. Saltei do 1º andar com o fumo a escorrer-me pelas costas.


O fascínio permanece e perco-me nas folhas amarelas de um livro antigo. Perco-me nos grandes clássicos da literatura, perco-me na beleza das letras e anseio pela capacidade de lhes dar
a vida que têm nos grandes livros de folhas amarelas.
Hoje tenho edições antigas desses livros e folheio-os com agrado. O fascínio continua. Foi a única coisa em que o fogo não tocou.